terça-feira, 19 de agosto de 2008

Alta definição pode ser privilégio de poucos

Imagens de alta definição são ótimas. Mas o projeto nacional de implantação da TV digital tem sido muito ruim. Os poucos brasileiros que tiveram o privilégio de assistir ao inesquecível espetáculo da abertura das Olimpíadas de Pequim em televisores de alta definição talvez concordem comigo: a TV brasileira nunca ofereceu espetáculo tão belo. Pena que só um em cada mil paulistanos pôde vê-lo com a qualidade da high definition (HD).


Meu amigo João Pedro me telefonou exultante, para falar de seu novo televisor de 52 polegadas, 1080 linhas de 1920 pixels (full HD), tela de cristal líquido e sintonizador integrado. Cidadão da classe A - como apenas 6% da população brasileira - ele investiu R$ 9 mil em seu televisor. E já se prepara para curtir os canais em alta definição na TV por assinatura e os novos DVDs Blu-ray em seu home theater depois das Olimpíadas.


O que realmente encanta o telespectador é, portanto, a beleza da alta definição. Essas imagens ainda serão, por alguns anos, a única inovação a ser proporcionada pela TV digital. E meu amigo parece não querer nada mais: "Olha, não estou absolutamente interessado em mobilidade, portabilidade, interatividade ou multiprogramação".


VELHOS ERROS


A maior frustração decorre da pressa do governo em inaugurar um sistema ainda incompleto como o padrão nipo-brasileiro. Outro problema sério é o baixo poder aquisitivo da população, que impede o acesso da esmagadora maioria aos televisores de tela plana de maiores dimensões, mesmo com a queda de mais de 60% no preço desses televisores nos últimos dois anos.


Nos Estados Unidos, quando foram lançados, em 1999 e 2000, os primeiros televisores digitais de 42 polegadas custavam mais de US$ 20 mil. Ganância da indústria? Absolutamente, não. Sem escala de produção e novos recursos tecnológicos, os preços só poderiam ser elevados. Hoje, com a produção em grande escala, o preço de um televisor de plasma ou cristal líquido (LCD), de 50 polegadas, full HD, 1080p, caiu abaixo de US$ 1.500. Ou seja, menos de R$ 2.500.


DECÁLOGO


Depois de entrevistar especialistas brasileiros e estrangeiros, nos últimos meses, consegui compilar as 10 regras básicas para o sucesso dos projetos de implantação da TV digital. Ei-las:


Melhor tecnologia - É preciso licitar a tecnologia digital com isenção e transparência. A melhor tecnologia, entretanto, não é necessariamente a mais cara nem a mais sofisticada, mas a que oferece a melhor relação custo/benefício ao País.


Mais informação - Mais de 80% dos brasileiros ainda não têm a menor idéia do que seja a TV digital. É preciso, portanto, informar a população, mostrando o que é (e o que não é) a TV digital. Para tanto, é preciso envolver toda a mídia eletrônica nesse processo educativo.


Sem demagogia - Não se pode transformar a TV digital em projeto político-partidário, até porque, com esse enfoque, o governo mais atrapalha do que ajuda.


Longa transição - A melhor contribuição do governo é elaborar um plano de longo prazo, com várias etapas, para o período de transição analógico-digital, com sucessivos testes de campo, sem caráter comercial, para grupos específicos de usuários.


Projeto industrial - É essencial que se crie um projeto industrial integrado, com a participação de fabricantes, universidade e emissoras, com vistas ao permanente desenvolvimento e à atualização tecnológica. Sem esse projeto, de nada adianta gritar contra os preços altos na fase de lançamento dos produtos, em especial dos set-top boxes. Xingar a indústria é a forma mais demagógica de tratar o assunto. Os preços só baixam com a combinação de produção em larga escala com evolução tecnológica e política tributária adequada.


Mais conteúdo - É preciso estimular a produção de documentários e filmes de alta qualidade que aproveitem todos os recursos da digitalização e do alto padrão de som surround, pois faltam bons conteúdos em alta definição.


Promessas realistas - O governo não deve criar expectativas infundadas, prometendo coisas que só o tempo e a maturação tecnológica poderão assegurar.


Interatividade demora - O mundo ainda dá os primeiros passos em matéria de interatividade. Numa perspectiva realista, só daqui a 10 anos ou mais é que teremos a decolagem maciça desse recurso.


Tudo é caro no início - É preciso reconhecer que, no início, infelizmente, toda nova tecnologia é cara. Por conseqüência, no começo, só o topo da pirâmide social tem acesso à TV digital. É o que está ocorrendo no Brasil. Não é nenhuma vergonha reconhecer que a TV digital, em seus primeiros anos, é essencialmente elitista, um privilégio das classes A e B. Assim ocorreu com o televisor em cores, o videocassete, o DVD, o celular, o computador e com o automóvel.


Futuro é IPTV - É preciso dizer, com todas as letras, que o futuro da TV digital será a IPTV, ou seja, a TV com a mesma linguagem ou protocolo da internet. Dentro de 30 anos, a TV aberta será apenas um nicho.


Fonte: estadao




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